Boletim CCBJ

A CCBJ envia regularmente boletim eletrônico aos associados. Na edição de abril, o artigo foi escrito professor Kojiro Takeshita (foto), do Departamento de Estudos Internacionais da Universidade Takushoku. Ele relatou sobre a viagem ao Brasil junto com alunos da universidade.

 

 

 Recomendações para formação de profissionais que possam aprofundar o intercâmbio econômico entre o Japão e o Brasil

 

Por Kojiro Takeshita

Professor do Departamento de Estudos Internacionais da Universidade Takushoku

 

 

         Cinco anos se passaram desde que saí da JETRO, onde trabalhei por 27 anos, para fazer parte do corpo docente da Universidade Takushoku. Mudei de área para me tornar professor universitário a fim de contribuir para a formação de profissionais que pudessem ajudar a fortalecer os desenvolvimentos econômico e industrial do Japão e da América Latina. Uma das coisas que percebi após começar a atuar na área acadêmica foi a falta de oportunidades de adquirir o conhecimento básico sobre a América Latina e, mais especificamente os assuntos referentes à economia e aos negócios daquela região. As abordagens sobre a América Latina nos livros didáticos dos ensinos fundamental e médio não mudaram muito desde a minha época de estudante. Ou seja, nos livros didáticos de História, a América Latina, incluindo o Brasil, é abordada basicamente como ex-colônia europeia”, e nos de Geografia, como uma região rica em recursos naturais”. No Japão, são poucas as universidades que oferecem cursos sobre a indústria e os negócios da América do Sul. Muitos profissionais começam a estudar a situação econômica e industrial daquela região ao participar de programas de estágio nas empresas em algum país latino-americano ou ao serem encarregados dos trabalhos relacionados à América Latina.

 

Quando eu trabalhava na JETRO, a falta de profissionais especializados na América Latina era um dos principais problemas enfrentados pelas empresas japonesas. Depois que me tornei professor, reconheci que existe realmente pouco conteúdo educacional sobre a América Latina, incluindo o Brasil.

 

Sociedade sem dinheiro e economia compartilhada: desenvolvimento tecnológico do Brasil surpreende estudantes japoneses

 

Organizar viagens internacionais como conteúdo educacional para alunos é algo quase inviável até o ensino médio em escola pública. Entretanto, no nível universitário, é mais comum estudantes participarem desse tipo de viagem organizada por seminários de pesquisa. Assim, fui encarregado de acompanhar um grupo de alunos enviados pela universidade ao Brasil, em agosto de 2023. 

 

Há muitos japoneses formados pela Universidade Takushoku que vivem no Brasil. A relação entre a Universidade de Takushoku e o Brasil tem mais de 100 anos de história. O herói da Restauração Meiji, Takamori Saigo, teve um neto chamado Ryuji, que entrou na Universidade Takushoku em 1920 e depois foi para o Brasil por ordem de seu pai, que era membro do conselho dessa instituição. Ele realizou pesquisas agrícolas em São Paulo e teria contribuído também para o ensino do judô para os filhos de imigrantes japoneses. Nas décadas de 1950 e 1960, houve um boom de emigração para a América do Sul entre universitários japoneses, que foi liderado pelos clubes estudantis como o Grupo de Estudos sobre Emigração e o Grupo de Estudos sobre Brasil,  da Universidade Takushoku. 

 

O Grupo de Estudos sobre Emigração já foi extinto. O Grupo de Estudos sobre Brasil, do qual faço parte como supervisor, hoje tem apenas quatro membros, mas no auge havia mais de 50 integrantes. Muitos dos que estudaram na Universidade Takushoku que emigraram para o Brasil durante esse período, hoje já são idosos e seus descendentes estão contribuindo para a sociedade brasileira. Na visita a um centro de pesquisas em Belém, por exemplo, fomos atendidos por um pesquisador que, antes de começar a apresentação, nos contou que seu pai foi aluno da Universidade Takushoku. 

 

Entre os 12 alunos que participaram da excursão, que durou 11 dias  desde o dia 20 agosto, quatro nunca haviam saído do Japão. Por meio desse tour, que teve a metade dos custos subsidiados pela universidade, eu queria mostrar aos alunos como o Brasil tenta promover desenvolvimentos econômico e social, reduzindo ao mesmo tempo a desigualdade social.

 

Desta vez, visitamos Rio de Janeiro, Belém, Manaus e São Paulo.  Conseguimos testemunhar o crescimento da fintech em nível nacional e o avanço do PIX, que permite efetuar pagamentos instantâneos 24 horas por dia sem necessidade de fornecer informações de contas bancárias. Os alunos ficaram impressionados ao descobrir que até no mercado de peixes em Manaus o uso do PIX para pagamentos já era algo comum.

 

Em São Paulo, visitamos as empresas japonesas e as instituições como a JETRO. Por meio dessa experiência, os alunos puderam aprender como o Brasil oferece grandes oportunidades para empresas japonesas em termos de negócios.

 

 

 

Falta de programas de treinamento para formação de profissionais fundamentais para  intercâmbio industrial

 

 

Observando os alunos que participaram da viagem, há algo que me impressionou muito. É a força dos encontros físicos com a população e a natureza locais, que foram capazes de mexer com os estudantes e despertaram a curiosidade neles. 

 

Hoje em dia, os estudantes dão grande importância ao chamado time performance”, uma expressão criada no Japão para representar a relação de tempo gasto e o retorno. Ou seja, os jovens são mais sensíveis à relação entre o tempo e o dinheiro necessários para exercer algo e o resultado obtido com isso. 

 

 

Seguindo essa ideia, somada ao aumento de custos de viagem devido à tendência atual de desvalorização do iene, é compreensível que os estudantes preferiram destinos mais próximos e baratos, como a Coreia do Sul e Taiwan, quando escolhem países ou regiões para viajar ou estudar. Leva-se mais tempo fazer viagem de ida e volta para o Brasil e a América do Sul, comparando com a Ásia, por exemplo. Os custos da viagem também são maiores em relação aos países do Sudeste Asiático. Além disso, ainda é forte a imagem negativa da América Latina associada à falta de segurança.

 

De fato, são poucos os estudantes japoneses que fazem intercâmbio por curto período no Brasil e em outros países da América Latina. De acordo com dados da Organização de Serviços para Estudantes do Japão (JASSO), de 2019, antes da pandemia, o número de jovens nipônicos que estudaram na América Latina por um período menor de um mês, excluindo os intercambistas enviados por meio de convênios firmados entre universidades, foi de 184. Para se ter uma ideia, a África registou número maior, com 246 alunos, e a Ásia, 13.758 alunos. 

 

No caso de alunos que cursam português nas universidades que têm convênios com universidades brasileiras, muitos deles prestam vestibular já com o intuito de participar de programas de intercâmbio. E essas universidades continuarão a desempenhar um papel importante na formação de profissionais que serão líderes nas futuras relações entre o Japão e o Brasil. Já para os alunos que não passarem no processo seletivo da universidade para estudar no exterior, ainda há a opção de trancar o curso para participar do programa de estudos de longo prazo oferecido pela Associação Central NipoBrasileira. Por outro lado, no caso de universidades que não tenham departamentos específicos relacionados ao Brasil e à América Latina, não há programas de estudos que permitam os alunos vivenciarem o desenvolvimento social local nos países sul-americanos em um curto período de tempo, e que também levem em consideração a questão dos custos da viagem que precisam ser arcados pelos participantes. Existem também viagens de estudo conduzidas por algumas ONGs, mas elas costumam priorizar programas que possam ser apresentados como parte das atividades da entidade, e não visam explorar a dimensão regional nem permitem interação com pessoas de origens diversificadas. Com o avanço tecnológico dos aplicativos de tradução e da inteligência artificial, que vem diminuindo cada vez mais a barreira do idioma, deveria haver mais programas de estudos com foco nas atividades, sem incluir cursos de idiomas, no caso de programas de curto prazo.

 

É importante desenvolver programas de treinamento com foco em economia que tenham um amplo alcance e tentar conquistar maior número de estudantes atraídos pelo potencial de crescimentos econômico e social do Brasil, que possam contribuir futuramente para o intercâmbio econômico e industrial entre Japão e Brasil. Acredito que isso ajudará também a aumentar o número de profissionais que atuam na área de intercâmbio industrial bilateral, além de promover a diversificação de negócios nipo-brasileiros.

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