Boletim CCBJ

A CCBJ envia mensalmente boletim eletrônico aos associados. Na edição de dezembro, o artigo foi escrito empresário Ichiro Yamamoto (foto), consultor administrativo e CEO da Ripple Ys Consulting. Ele também é o auditor da CCBJ.

Yamamoto faz uma análise sobre a relação entre o Brasil e o Japão.

 

Você está bem? Se você estiver bem, consegue fazer qualquer coisa”

 

Por Ichiro Yamamoto

Consultor administrativo

CEO da Ripple Ys Consulting

Auditor da CCBJ

 

 

O Festival Brasileiro foi realizado pela primeira vez em três anos, no dia 19 de novembro, quando parecia estarmos na primavera, após dias seguidos com temperaturas amenas atípicas para esta época do ano, talvez devido à influência do aquecimento global. Apesar das máscaras no rosto das pessoas, o evento estava animado com um público que parecia se sentir quase livre da pandemia, o que me deixou bastante feliz.

O ano 2022 começou com a esperança de que a pandemia chegasse ao fim. Mas em fevereiro, o mundo recebeu a notícia da invasão russa na Ucrânia, e vimos muitos ucranianos fugindo e deixando sua terra natal. Indignado com os governantes insensatos, até hoje rezo para que esta guerra termine em breve. Enquanto isso, pouco antes do fim do ano, chegou a notícia da vitória de Lula nas eleições presidenciais brasileiras contra o atual presidente Bolsonaro. Já que Lula e Putin foram os líderes contemporâneos na época em que surgiu o termo BRICS, criado pelo economista Jim O’Neill, espera-se que o novo presidente da República possa exercer sua influência sobre a Rússia para ajudar a encontrar uma solução a esta guerra.

 A morte do ex-lutador Antonio Inoki este ano, para mim, foi um acontecimento que marcou o fim de uma era. Quando era estudante, eu adorava a luta livre profissional, e ficava empolgado com suas lutas e seus golpes. Mais tarde, quando Inoki já atuava como um profissional, eu estava retornando ao Japão a bordo de um avião da Varig depois de uma viagem de negócios ao Brasil, quando tive o prazer de me sentar ao lado dele, que havia feito um evento de luta livre num ringue montado na Amazônia como parte de um projeto ecológico.

 Na ocasião, lembrei de um colega meu no Brasil, que havia sofrido meses antes um derrame que o deixou semiparalisado, e estava fazendo sessão de fisioterapia. Como ele era um grande fã do Inoki (mais do que eu), resolvi pedir a Inoki para dar um autógrafo num caderno. Ele atendeu gentilmente ao meu pedido e perguntou o sobrenome do meu colega para escrever, mostrando a habilidade de quem está muito acostumado a dar autógrafos, com a seguinte mensagem: Caro A, vamos sempre viver com sorriso, por mais difícil que esteja a vida. Ardente espírito de luta, Antonio Inoki . E esse caderno tornou-se um tesouro da família do meu colega.

 Você está bem? Se você estiver bem, consegue fazer qualquer coisa. Essa era uma frase que Antonio Inoki usava para interagir com o público. Ele era famoso por dar tapas nas pessoas que as pediam para injetar ânimo. Mas será que os japoneses realmente conseguiram incorporar esse “ânimo? A meu ver, não. Hoje, o Japão continua caindo ladeira abaixo, sem conseguir sair das “três décadas perdidas”, período que começou desde o estouro da Bolha Econômica nos anos 90, sendo caracterizado pela falta de crescimento econômico significativo, declínio da competitividade internacional e aumento da dívida nacional. E há pessoas que dizem que, esse período poderá se estender a quatro décadas, se prosseguir a atual tendência.

O Brasil, por outro lado, vem aumentando sua força nacional desde os anos 80, apesar de várias dificuldades. O tamanho da economia brasileira, que era cerca de um sétimo do da japonesa há 30 anos, hoje equivale à metade dela. O número de empresas brasileiras com atuação mundial como a WEG, Embraer, Vale e Petrobras também vem aumentando.

 Nesse cenário, para se tratar da questão de como a relação nipo-brasileira deve ser desenvolvida, seria preciso mudar a nossa maneira de pensar que ainda está baseada nas relações do passado, e reconhecer as posições relativas do Japão, que agora está se tornando um país comum, deixando de ser uma potência econômica, e do Brasil, que está subindo a escada para se tornar um verdadeiro líder na América Latina. E os dois países devem deixar a antiga relação, na qual o Japão, como uma nação desenvolvida, fornece tecnologias agrícola e industrial ao Brasil e oportunidades de trabalho para migrantes brasileiros, em troca de importar os produtos agrícolas e recursos naturais do seu parceiro em desenvolvimento. Daqui para frente, deve ser construída uma nova parceria, na qual os dois países possam desfrutar melhor dos valores agregados que seu parceiro oferece. A cooperação poderia incluir, por exemplo, intercâmbio de programas de treinamento de pesquisadores em cursos de doutorado e pós-doutorado na área acadêmica, desenvolvimento de projetos conjuntos na Web.3.0 usando a internet e outras tecnologias digitais, cooperação em monitoramento remoto aproveitando a diferença de horário, cooperação mútua para complementar o desenvolvimento de negócios em mercados vizinhos, e ação conjunta para entrar nos mercados de países terceiros na África e em outras regiões, por exemplo. Para viabilizar uma nova parceria, serão necessárias ideias inovadoras e grandiosas que não sejam apenas uma extensão do que vem sendo feito.

 Entretanto, os nikkeis continuarão a ser uma ponte entre os dois países, tanto para manter conexões linguísticas quanto emocionais, mesmo com a passagem de gerações. Para o Japão, os descendentes de japoneses no Brasil não representam apenas a maior comunidade nikkei do mundo, mas também formam um grupo importante que sempre nos apoia e incentiva.

 Nos dias de hoje, em que o Japão e o Brasil são parceiros iguais e a palavra “geopolítica” passou a ser muito usada, eu pretendo seguir em frente sempre sentindo que somos vizinhos próximos, em vez de pensar que estamos em dois lados opostos da Terra. Acredito que Inoki deve estar com o mesmo pensamento lá no outro mundo.

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