A Câmara de Comércio Brasileira no Japão envia boletim eletrônico aos associados. Na edição de abril, o artigo foi escrito pelo advogado Masato Ninomiya (foto). Ele analisou a situação do Brasil diante da pandemia do coronavírus.
Ninomiya é advogado militante, tradutor público juramentado e professor doutor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Como voluntário, preside o CIATE (Centro de Informação e Apoio ao Trabalhador no Exterior) há 28 anos.
A PANDEMIA DO NOVO CORONOVÍRUS E OS ACONTECIMENTOS EM ABRIL DE 2020
Por Masato Ninomiya
*Ninomiya é advogado militante, tradutor público juramentado e professor doutor na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Como voluntário, preside o CIATE-Centro de Informação e Apoio ao Trabalhador no Exterior, há 28 anos.
No Brasil, o primeiro caso de infecção por novo coronavírus foi confirmado em São Paulo no dia 25 de fevereiro, e a primeira morte no País foi em 17 de março. Desde então, os números cresceram rapidamente, e agora, no final do mês de abril, deverão chegar a cerca de 70 mil infectados e mais de 5 mil mortes. Sabe-se que no Japão, os números ainda são menores, apesar da preocupação das autoridades central, provincial e municipal, principalmente durante os feriados de Golden Week.
O Estado de São Paulo tem os índices mais elevados do País. O governador João Doria decretou quarentena para todos os 645 municípios paulistas a partir do dia 24 de março, obrigando o fechamento dos restaurantes, cafés e bares (exceto os serviços de entrega), instituições educacionais desde creches até universidades, parques, museus, cinemas, teatros etc. Nesse período, somente os serviços essenciais como supermercados, lojas de conveniência, postos de abastecimento, bancos, transporte público, pet shops podem funcionar, assim como sistema de saúde, polícia e corpo de bombeiro. Neste momento, o decreto de quarentena está estendido até o dia 10 de maio. O governo já fala em afrouxamento por setor a partir do dia 11 de maio, mas ainda não se tem certeza da evolução desta pandemia.
O maior problema que enfrentamos agora é a falta de liderança dos governantes. O presidente Jair Bolsonaro defendia a medida de isolamento apenas para idosos e pacientes com comorbidades, a fim de evitar a estagnação econômica (com índice de aprovação de 18%). Em contrapartida, o ministro da Saúde Mandetta, assim como a esmagadora maioria de governadores, apoiava a quarentena mais ampla e a promoção de isolamento domiciliar, trabalho remoto e fechamento dos estabelecimentos públicos.
Enquanto que o ministro da Saúde, os governadores e os prefeitos têm alertado a população para que evitasse aglomerações, locais fechados e contatos próximos com outras pessoas, seguindo as orientações da OMS, o presidente, acompanhado por outros ministros mais próximos, visitou hospitais do Exército e farmácias, foi para uma padaria onde consumiu lanche dentro do estabelecimento, que estava aberto somente para manter o serviço de delivery, e ainda cumprimentou pessoas com abraços e apertos de mão, além de posar para fotos.
No dia 19 de abril, ocasião em que houve diversas manifestações a favor do presidente nas grandes cidades do País, com cartazes apoiando o governo militar chefiado por Bolsonaro, a volta do famigerado AI 5, os manifestantes em Brasília, se reuniram em frente ao Quartel General do Exército e o presidente foi para lá acompanhado de seus assessores e novamente saiu a cumprimentar os apoiadores com aperto de mãos e abraços, o que provocou crítica da imprensa e dos governadores e prefeitos que se esforçam em cumprir a determinação do ministro da Saúde e da OMS. O presidente declarou que se mostra otimista em relação ao desenvolvimento de medicamentos à base de cloroquina, mas os especialistas alertam que a sua eficácia ainda não foi comprovada e a produção não teria capacidade de atender imediatamente à demanda. Dois dias depois, o ministro Mandetta pediu demissão do seu cargo e foi nomeado o oncologista Nelson Teich para substituí-lo.
Além disso, boa parte da população brasileira é pobre e vive em casas pequenas com quartos ocupados por várias pessoas, ambiente que facilita a transmissão do vírus. Para evitar demissões nas fábricas, lojas e empresas, foram introduzidas algumas mudanças na lei trabalhista, porém, mais de 10 milhões de trabalhadores já entraram com pedido de seguro-desemprego, segundo a imprensa local.
Como uma medida para ajudar os cerca de 50 milhões de trabalhadores informais, foi criado auxílio emergencial. Estima-se que cerca de metade deles deve cumprir os requisitos exigidos para receber o benefício.
O governo federal separou R$ 98 bilhões em recursos para financiar o programa. Para ter direito ao auxílio, o trabalhador deve ter mais de 18 anos de idade, renda familiar mensal per capita de até meio salário mínimo (R$522,50) ou renda familiar mensal total de até R$ 3.135,00 e não ser beneficiário de outras ajudas do governo.
Quem cumpre esses requisitos, mas não possui conta bancária, poderá abrir conta digital da Caixa Econômica Federal, cadastrando dados do CPF e outros comprovantes, para receber o benefício no valor de R$600 em três parcelas. Desde o dia 8 de abril, 5 milhões de pessoas já receberam o auxílio, mas a medida só deve trazer efeitos paliativos. Esperamos que a pandemia seja controlada o mais rápido possível e que a economia volte ao normal.
Em relação ao atendimento médico para infectados, diferentemente dos EUA, por exemplo, no Brasil há sistema de saúde assegurado pela Constituição, o SUS, para todos os cidadãos e qualquer pessoa, inclusive os mais carentes, têm acesso aos hospitais públicos e aos privados filantrópicos e podem ser internados para receber tratamentos. Com exceção das grandes metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Recife e Salvador, porém, não há leitos e UTIs suficientes para atender aos pacientes. Mesmo nas principais capitais do País, os hospitais já estão lotados. Em São Paulo, o Hospital de Campanha do Pacaembu, montado no estádio de futebol, já está funcionando com 200 leitos instalados no gramado. Além disso, mais instalações do gênero estão sendo construídas no Centro de Convenções do Anhembi, com 1.800 leitos, e também na pista de atletismo do Ginásio Ibirapuera, com centenas de leitos.
Devido à falta de máscaras cirúrgicas, respiradores e outros recursos médicos, o governo federal resolveu importar imediatamente 240 milhões de máscaras da China, que pesam 960 toneladas. Os primeiros vôos já estão chegando, mas serão necessários total de 40 vôos.
É uma ironia do destino que o Brasil seja obrigado a importar materiais médicos da China, depois da polêmica provocada pelos comentários do presidente Bolsonaro, de seus filhos e do ministro da Educação, de que a pandemia começou em Wuhan. E para completar, a declaração do ministro de Estado das Relações Exteriores, chamando o coronavírus de “comunavírus” provocou protestos do governo chinês, mas as críticas vieram também por parte de diversos embaixadores aposentados do Itamaraty, por contrariar as boas tradições diplomáticas da Casa do Rio Branco.
E o coroamento do mês que termina, foi a entrevista concedida por Sérgio Moro, ministro da Justiça e Segurança Pública, no dia 24 de abril, provocado pela demissão do Diretor Geral da Polícia Federal, seu homem de confiança, que tomou conhecimento através do Diário Oficial da União que circulou na madrugada, com a agravante de que o Diretor Geral teria sido exonerado a pedido, fato esse negado pelo próprio e a assinatura digital do Sérgio Moro, foi negado por ele que disse não ter autorizado esta assinatura.
O ministro fez algumas acusações sérias contra o presidente da República por ter tentado interferir nas investigações da Polícia Federal e que teria oferecido o nome de um outro delegado de carreira em troca de sua eventual nomeação para o Supremo Tribunal Federal. Após efetuar estas considerações, Sérgio Moro pediu demissão do seu cargo.
Na mesma tarde, o presidente da República, rodeado de todos os ministros, concedeu entrevista rebatendo as críticas do seu ex-ministro da Justiça. O fato teve repercussão nacional e internacional. Acompanhamos o desenrolar do acontecimento, com a nomeação do novo ministro da Justiça. Ouve-se falar que o presidente irá desmembrar a Segurança Pública do ministério da Justiça. A imprensa noticiou também a nomeação do novo Diretor Geral da Polícia Federal, mesmo antes da nomeação do ministro da Justiça.